Prevaricação; PPPI’s e interesses privados; Câmaras Municipais; acusação | Ministério Público no Diap Regional do Porto (1ª secção)

 


26/05/2023

 
 O Ministério Público no Diap Regional do Porto (1ª secção) acusou cinco arguidos, sendo um empresário, outro colaborador deste, e os outros três titulares de cargos políticos, que assumiam os cargos de Vereador, Presidente de Câmara Municipal e Vice-Presidente, respetivamente, nas Câmaras Municipais de Oliveira de Azeméis, Armamar e Vila Verde imputando-lhes:
  • aos arguidos empresário e seu colaborador, três crimes de prevaricação, por titular de cargo político, um dos quais na forma tentada;
  • ao arguido Vereador, um crime de prevaricação, por titular de cargo político, na forma tentada;
  • a cada um dos arguidos, Presidente da Câmara e Vice-Presidente, na forma consumada, de um crime de prevaricação, por titular de cargo político;
O Ministério Público considerou como fortemente indiciado que o arguido, empresário, na execução de um plano por si traçado, contando com o auxílio do outro arguido seu colaborador, aproveitando o alargamento da legislação sobre as parcerias público-privadas às autarquias locais, após o ano de 2006, decidiu apresentar junto dos autarcas de Oliveira de Azeméis, Vila Verde e Armamar soluções de investimento abrangidas por esta legislação, com o objetivo de serem adjudicadas à sua empresa, as obras públicas de grande envergadura, desvirtuando as regras de contratação pública, nomeadamente:
  • beneficiando de informação privilegiada face a outros potenciais concorrentes que lhe permitia preparar a apresentação das propostas antes da publicitação dos procedimentos concursais; 
  • por os próprios termos do concurso, no que aos critérios de seleção respeitavam, serem moldados à situação económica e financeira da sociedade representada pelo arguido, assim garantindo antecipadamente o enquadramento da empresa nos requisitos exigidos no concurso quanto à qualidade da adjudicatária;
  • por os prazos para apresentação das propostas serem, em geral, muito curtos, concedendo-lhe condições exclusivas e objetivas que lhe permitiam apresentar-se a concurso;
  • beneficiando do empolamento artificial do objeto da parceria, reduzindo a possibilidade de apresentação de propostas por parte de outros concorrentes, sem capacidade técnica e financeira para se apresentarem a concurso com objetos daquela dimensão.
Em consequência desse plano, a que os arguidos autarcas acederam, o arguido empresário, com o auxílio do arguido colaborador, apresentou os respetivos projetos, para formalização de PPPI’s naqueles Municípios, vindo a formalizar tais parecerias nos Municípios de Vila Verde e Armamar.
 
Do lado dos autarcas, a adesão às pretensões daqueles arguidos, permitiu-lhes, perante o impedimento que detinham em realizar investimentos pela ausência de capacidade legal de endividamento, apresentar aos munícipes as obras de grande envergadura prometidas em campanha eleitoral de 2005, e com isso se promoverem nas eleições do ano de 2009, assim beneficiando de uma solução alternativa para execução dessas obras, contornando os constrangimentos financeiros e os limites legais ao endividamento que o investimento necessário para tais obras reclamava, sujeito ao controlo da Direcção-Geral das Autarquias Locais e do Tribunal de Contas. 
 
Através destas sociedades veículo, de capitais mistos, em que a sociedade daquele arguido era parceiro, foram depois adjudicadas as obras à empresa daquele arguido, mediante a celebração de simples contratos de empreitada, sem submissão, nessa sede, a qualquer procedimento concorrencial.
 
Com tais obras, o arguido empresário faturou às sociedades veículo:
  •  €2.287.098,77, no Município de Armamar (valor já pago);
  • €695.029,62, no Município de Vila Verde (valor ainda não pago, encontrando-se a ser exigido pela empresa do arguido em processo de execução no TAF do Porto).
Tais valores seriam, a final, suportados pelas aludidas Câmaras Municipais, através do pagamento das rendas às sociedades veículos, pelas exploração e manutenção das infraestruturas.
 
Tal esquema criminoso só não se concretizou no Município de Oliveira de Azeméis pois que, apesar de o procedimento ter chegado à fase de publicação do concurso para constituição da PPPI e de apresentação e apreciação de propostas, onde a sociedade representada pelo arguido empresário foi a única a presentar proposta, o procedimento não avançou mercê de várias divergências dessa proposta que a empresa não esclareceu, motivando a que o júri do procedimento deliberasse a não adjudicação.
 
O Ministério Público requereu a perda a favor do Estado dos suprarreferidos valores pagos ou em processo de execuação, com a viciação de todos os procedimentos legais, e a condenação dos arguidos no pagamento dos mesmos.
 
Encontra-se a decorrer o prazo para eventual abertura de instrução, após a defesa ter requerido a respetiva prorrogação.
 
NUIPC 1406/14.3TDPRT